Texto de Pyr Marcondes, Senior Partner da Pipeline Capital.
Para um sistema que se auto-indulgia como inexpugnavelmente seguro e transparente, as últimas semanas do mundo cripto foram reveladoramente devastadoras.
A quebra em cadeia (e esse é um ponto de atenção para você imediatamente colocar em mente aí, a cadeia …) de algumas entre as mais representativas exchanges do setor não foi um fenômeno pontualmente circunstancial: foi sistêmico.
Como muito bem colocou em um post o Rodrigo Batista, founder e CEO da Digitra, uma exchange brasileira de cripto… “o colapso da exchange de criptoativos FTX é uma história de crimes em série”.
Talvez possamos eventualmente comparar com as quebras da Enron, Lehman Brothers e Bernie Madoff. Lembram?
Pois, conceitualmente, é a mesma coisa: o sistema mostrou suas falhas, não apenas as empresas isoladamente
Isso não quer dizer que ele quebrou, como não quebrou o capitalismo com os casos acima. Cripto vai sobreviver.
Mas vamos por partes.
A falta de regulamentação salta aos olhos como a mais óbvia razão de ser da catástrofe. Um sistema regulado teria mitigado parte – talvez não o todo, como não conseguiu no caso de Eron e etc. – do tsunami, sendo imaginável que a discussão sobre as regras de regulação deva ser o próximo passo para reerguer o sistema e tentar recolocá-lo de pé. Complexa um monte, mas indispensável. Vai demorar, mas vai ir acontecendo…. no gerúndio … nos próximos meses/anos.
Aos que argumentam que o livre mercado é a melhor forma de regulação, os exemplos acima acabam por provar que não é bem assim. Ao constatarem o erro de cálculo com FXT, VCs envolvidos lançaram mão de uma série de iniciativas nada ortodoxas com os recursos que tinham sob custódia de seus investidores. Foram criando à revelia uma cadeia (aquele que citei lá em cima) perversa de retro investimentos – o que,se comprovado, é crime – que, num dado momento, desabou. Investidores junto.
Ainda assim, como nos lembra apropriadamente o excelente Deal Book, do New York Times … “se o caso FTX for uma fraude, a regulamentação por si só poderia não ter sido suficiente para detê-la. Madoff não morava em uma ilha fora da jurisdição dos EUA – ele morava na Lexington Avenue. Se finalmente descobrirmos que a ruína da FTX é a primeira de muitas em uma indústria que foi construída sobre uma pilha de alavancagem offshore, a lição regulatória será realmente o oposto: o S.E.C., C.F.T.C. e o Tesouro terão se mostrado prescientes por todos os seus avisos ao público de que a criptomoeda era muito arriscada.”
Em discussão aqui está não apenas a regulação em si, mas a própria essência liberal dos mercados financeiros.
Diz-se da Web3 que ela é mais descentralizada e democrática (e é mesmo), mas talvez enganam-se os que imaginam aquele mesmo sonho libertário (eu incluso) da internet em seu início, de que todos (cidadãos) seríamos donos da web. Não, não seremos. Digo, nem fomos da web 1.0, nem seremos da Web3. Grupos econômicos e plataformas tecnológicas (as que conhecemos e outras que nem conhecemos ainda) continuarão dominando a espinha dorsal do sistema.
No caso do sistema financeiro, os fundos institucionais e os bancos, e todo o ecossistema do mercado aberto das bolsas e investimentos.
O mercado cripto seguirá sua vida porque ele é um pedaço inevitável do futuro. Se não for exatamente esse que temos agora, uma outra versão melhorada dele subsistirá e os ativos financeiros digitais seguirão sua vida.
O fato da Web3 ser mais inclusiva amplia o mercado para o mundo financeiro. Coloca no jogo a maior parte das pessoas que nunca pode participar dessa festa. E isso pode vir a ser ainda mais lucrativo do que o modelo fechado atual.
Para o bem ou para o mal, o Capital busca – essa é sua natureza – valorizar-se permanentemente. Não será, acredito, diferente agora.
Texto de Pyr Marcondes, Senior Partner da Pipeline Capital.
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